o grande historiador e pensador do século XX, eric hobsbowm, morreu há quatro anos, mas o seu pensamento é vivo e por isso urgente e necessário conhecer. aqui deixamos um testemunho de luís carapinha, escrito logo após a sua morte, e também outros através de vídeos que abordam a sua obra na perspectiva de outros historiadores e dele próprio em entrevistas realizadas.
como ele próprio afirmava faz todo o sentido o questionar do futuro porque aquilo que se faz no passado tem continuidade nesse futuro onde queremos chegar a soluções que façam com que o ser humano viva melhor. já no início deste século XXI hobsbowm alertava para o perigo do aumento das desigualdades sociais porque criam tensões e enorme instabilidade que levam a rápidas explosões e quedas dramáticas.estas transformações rápidas e imprevisíveis serão certamente aproveitadas politicamente por governos reaccionários - racismo, xenofobismo, fundamentalismo económico e religioso, como aliás temos vindo a verificar nos tempos de hoje.
vivas estão pois as suas palavras, principalmente as do final da sua autobiografia, quando hobsbowm escreve que o "mundo não vai melhorar se não tentarmos lutar por um mundo melhor, não podemos desistir". por isso também o trouxemos até aqui.
Eric Hobsbawm: marxismo e história. 02.10.2012, 15h37, Vermelho. Luís Carapinha
O historiador marxista Eric Hobsbawm, que se despediu da
vida na madrugada da segunda-feira (1º) disse, certa vez, sentir-se em casa na
América Latina. “É o único lugar no mundo em que as pessoas fazem política e
falam dela na velha linguagem – a dos séculos 19 e 20, de socialismo, comunismo
e marxismo”, disse. Podia ter acrescentado, no mesmo sentido: é o lugar da
revolução do século 21.
A frase tem sentido. Sua história
pessoal se confunde com a do século 20, o pequeno século 20 como ele o
caracterizou, compreendendo-o entre os limites temporais da Revolução Russa, de
1917, ao fim da União Soviética, em 1991. Ele foi testemunha pessoal,
quando rapaz, da ascensão do nazismo na Alemanha, experiência determinante para
sua adesão ao marxismo e ao comunismo, e fundamento de sua convicção da
necessidade da revolução. Assistiu ao desastre da 2ª Grande Guerra e, historiador
consequente, encarou a vitória soviética sobre as forças de Hitler
como o acontecimento basilar para explicar a história do século 20 e também
para valorizar a experiência soviética de construção do socialismo, apesar dos
erros que houveram.
Foi o maior historiador de nosso tempo,
solidamente baseado num método do qual nunca se afastou. Não aderiu a
modismos e, quando o fracasso da construção do socialismo no Leste Europeu
levou tantos intelectuais para o outro lado das barricadas, abandonando o pensamento
avançado, Hobsbawm surpreendeu a todos, mantendo-se fiel ao pensamento herdado
de Marx e Engels e, mais do que isso, atribuindo a ele, corretamente, a
condição de único método capaz de permitir a compreensão profunda e correta
daqueles acontecimentos.
O marxismo foi, para ele, ferramenta conceitual não
apenas para o exame das condições da revolução mas também para compreender a
própria evolução, suas contradições, avanços e recuos. E também instrumento
teórico essencial para compreender a natureza e as transformações do próprio
pensamento marxista. A tarefa do historiador, disse certa vez, não
é meramente descrever os acontecimentos, mas explicar como e porque o mundo
muda, e não há outro instrumento capaz de cumprir esta tarefa
senão o pensamento marxista.
Os livros que deixou – entre eles uma
monumental História do Marxismo, que coordenou – tiveram o objetivo de
concretizar esta explicação e apoiar a ação transformadora. São imprescindíveis
justamente por cumprirem a exigência básica da concepção materialista da
história: olhar a vida em sua integridade, incorporar à análise a
multiplicidade dos aspectos em que ela se expressa: econômicos, políticos,
sociais, culturais, ideológicos, etc.
Esta é a base dos elogios que fez à América Latina,
ao Brasil pós-Lula, ao próprio Lula, a experiência cubana e a seu líder, Fidel
Castro. Esse elogio decorre da compreensão de que a revolução assume formas
sempre renovadas, e não se detém, apesar da aparência conjuntural de recuo.
É também o fundamento de sua convicção
da atualidade e vitalidade do marxismo enquanto pensamento avançado e
transformador, e da necessidade da superação do capitalismo por
outra forma, mais avançada, de organização da sociedade. Ele
foi, à sua maneira, um militante dessa transformação e colocou todo seu esforço
intelectual (expresso em dezenas de livros) a serviço dela. “Não existe
esperança reduzida hoje. O que digo agora é que os problemas do
século 21 exigem soluções com as quais nem o mercado puro nem a democracia
liberal pura conseguem lidar adequadamente. É preciso calcular uma
combinação diferente. Que nome será dado a isso não sei. Mas é bem capaz de não
ser mais capitalismo, não no sentido em que o conhecemos aqui e nos EUA”,
disse, há dois anos, em uma entrevista ao britânico The Guardian.
Foi um historiador e um homem de seu
tempo. Seus escritos serão cada vez necessários para quem quiser compreender as
mudanças vividas pelo mundo desde a revolução francesa de 1789 até as contradições
e conflitos do século 20 e o limiar da nova luta pelo socialismo, no início do
século 21. Foi um gigante do pensamento voltado para a ação transformadora.
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